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Uma comunicação “pobre” e com os pobres

Logo após a contagem dos votos do conclave de 2013 e a confirmação do nome do eleito, o cardeal brasileiro Claudio Hummes se aproximou do então cardeal Jorge Mario Bergoglio, novo sucessor de Pedro, e lhe disse: “Não se esqueça dos pobres”. Foi assim que nasceu no papa o chamado a se...

Logo após a contagem dos votos do conclave de 2013 e a confirmação do nome do eleito, o cardeal brasileiro Claudio Hummes se aproximou do então cardeal Jorge Mario Bergoglio, novo sucessor de Pedro, e lhe disse: “Não se esqueça dos pobres”. Foi assim que nasceu no papa o chamado a se fazer chamar de “Francisco”.

Para um comunicador cristão, essa frase também deve ressoar constantemente. Porque os pobres são a “carne de Cristo”, e a pobreza é o “âmago do Evangelho”, uma “opção fundamental” da Igreja, como afirmou o Papa Francisco em sua mensagem para o 1º Dia Mundial dos Pobres, em 2017. Para ler e narrar a realidade do mundo, é preciso “tocar a carne de Cristo” nos pobres. “Para os discípulos de Cristo, a pobreza é, antes de mais, uma vocação a seguir Jesus pobre”, ressalta o papa.

O desafio, portanto, é seguir Jesus pobre mediante uma comunicação “pobre”. Mas “pobre” não como falta, ausência, perda. A pobreza, continua Francisco, “significa um coração humilde, que sabe acolher a sua condição de criatura limitada e pecadora, vencendo a tentação de onipotência que cria em nós a ilusão de ser imortal”. Então, o que significa “pobreza” a partir da comunicação? Tentemos responder a partir de três ideias-chave.

A comunicação cristã começa antes de qualquer esforço nosso: é iniciativa divina

A evangelização, como ápice da comunicação cristã, não é “uma heroica tarefa pessoal”, mas sim “obra de Deus. Jesus é o primeiro e o maior evangelizador. Em qualquer forma de evangelização, o primado é sempre de Deus” (Papa Francisco, Evangelii gaudium, n. 12). 

Uma comunicação “pobre” se afasta de todo e qualquer “mundanismo espiritual”. Mesmo com “aparências de religiosidade e até mesmo de amor à Igreja”, esse mundanismo busca “a glória humana e o bem-estar pessoal” (EG 93). Procura “os próprios interesses, não os interesses de Jesus Cristo”, o que pode levar a um “cuidado exibicionista (…) do prestígio da Igreja” (EG 95). Uma comunicação cristã “pobre” vai além do “funcionalismo empresarial, carregado de estatísticas, planejamentos e avaliações, em que o principal beneficiário não é o povo de Deus, mas a Igreja como organização [em que] já não há ardor evangélico, mas o gozo espúrio de uma autocomplacência egocêntrica” (EG 95).

Mesmo que tenhamos as melhores estratégias e técnicas e até falemos a “língua dos homens e dos anjos”, sem a iniciativa divina, tudo é em vão (cf. 1Cor 13). Um comunicador cristão toma distância de todo e qualquer “narcisismo midiático”. 

Já dizia Paulo VI, na Evangelii nuntiandi (1964): “As técnicas da evangelização são boas, obviamente; mas, mesmo as mais aperfeiçoadas não poderiam substituir a ação discreta do Espírito Santo. A preparação mais apurada do evangelizador nada faz sem Ele” (n. 75).

A comunicação cristã não é marketing: é dom gratuito

Gratia grátis data: a Graça é dada de graça. A salvação, o amor de Deus, o reinado anunciado por Jesus, nada disso pode ser considerado um “produto”, porque não demandam qualquer tipo de retorno. A salvação foi dada na gratuidade do dom e da entrega do próprio Filho. O amor de Deus é desinteressado, é dado “de maneira unilateral, isto é, sem pedir nada em troca”, afirma Francisco na mensagem ao 1º Dia Mundial dos Pobres.

Por isso, não se deve confundir a comunicação cristã com aquilo que é praticado no “mercado de bens religiosos”, marcado pela “concorrência religiosa”, pela “fidelização” de novos “adeptos”, pela busca de “visibilidade positiva” e de “aumento de popularidade”. Como álibi desse tipo de abordagem, se costuma até dizer que o próprio Jesus foi “o maior marketeiro da história”, e a cruz – de “escândalo para os judeus e loucura para os pagãos” (1Cor 1, 23) – se converte no “maior logotipo que conhecemos na história”. 

Tudo isso se encontra no extremo oposto da evangelização, “que tem o seu fundamento último na iniciativa livre e gratuita de Deus” (EG 111) e que deve ser “dirigida gratuitamente” aos pobres como “destinatários privilegiados do Evangelho” (EG 48). Se acolhemos a Graça “de graça”, somos convidados a “dar também de graça”, como diz Jesus (Mt 10, 8), sem interesses. “A salvação não se compra, não se vende: se dá. É gratuita”, afirmou o papa em sua homilia do dia 25 de março de 2014. 

A comunicação cristã continua depois de todo esforço nosso: é alterizante

A comunicação cristã nasce primeiramente de um encontro com um “Outro”, “com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte” (Bento XVI, Deus caritas est, n. 7). Mas há um segundo encontro imprescindível: o “encontro com os pobres”, como indica o papa na sua mensagem de 2017. “O caminho do discipulado e a conversão encontram, na caridade que se torna partilha, a prova da sua autenticidade evangélica.” 

Em uma viagem a Bolonha, Itália, em outubro de 2017, Francisco exclamou: “Como é estranha a matemática de Deus: só se multiplica quando se divide!”. Comunicar também é participar dessa “matemática”, colocando-se “em atitude constante de ‘saída’” (EG 27), na “dinâmica do êxodo e do dom, de sair de si mesmo” (EG 21), “dividindo” o pouco que se tem e que se é, para “multiplicar” boas novas, dando sentido ao mundo.

É a partir dos pobres e com eles que a comunicação cristã, entendida como partilha da fé, “encarna” o Evangelho no hoje da história.

 

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