Dulce, com os pobres e dos pobres, exemplo de comunicação amorosa

"O essencial é confiar em Deus. O amor constrói e solidifica." (Santa Dulce dos Pobres)

Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes. Por este nome nasceu para o mundo o anjo bom da Bahia e do Brasil, que tomou para si o nome religioso de Dulce, em homenagem à sua mãe. Ao ser inscrita no livro dos santos, oficialmente foi reconhecida como Santa Dulce dos Pobres, selando aquilo que na vida terrena fora sua missão e continuaria sendo a do céu. Ela é “dos pobres” porque, primeiro, se fez “com os pobres”. Uma interpelação à nossa comunicação para que não só seja dos pobres, mas que seja feita com eles.

Ainda aos 13 anos, movida por um sentimento de justiça, acolhia mendigos e doentes em sua casa, transformando a residência da família num centro de atendimento. Era a chama de Deus ardendo em seu coração e inspirando o que, mais tarde, ela construiria e deixaria como legado para o Brasil.

Mulher ergue foto de Santa Dulce dos Pobres
Ação de Graças pela canonização de Santa Dulce na Arena Fonte Nova, em Salvador, 2019 (Créditos: Marcus Tullius)

No período de sua canonização, em 2019, tive a graça de participar da festa brasileira, em Salvador, produzindo conteúdo para televisão, passando pelos lugares onde a santa baiana viveu e ouvindo testemunhos de quem conviveu com ela. Esta é uma peculiaridade dos santos de hoje, mulheres e homens tão perto de nós, temporal ou fisicamente, que podemos ver de perto o que foi a sua experiência de fé. Ali descobri o segredo que fez aquela mulher de estatura franzina tão especial: ela fez-se de Deus por meio de uma intimidade na oração.

Na capela das Obras Sociais, onde viveu, e na paróquia da Boa Viagem, onde ia com frequência celebrar os sacramentos, tinha lugar cativo. Ali dedicava precioso tempo em conversa com Deus, certamente pedindo pelos pobres, a quem tanto amou. Ela entendeu que “o essencial é confiar em Deus. O amor constrói e solidifica.”

 

Falar com a voz do coração

Na Capela das Relíquias, no Santuário de Santa Dulce dos Pobres, um túmulo de vidro com uma efígie em tamanho real da Santa Dulce dos Pobres guarda seus restos mortais (Créditos: Marcus Tullius)

Num tempo em que discursos agressivos e negativos propagam-se tão facilmente, Santa Dulce nos inspira a um estilo cristão na rede, como nos pede o documento “Rumo à presença plena”. O que ela viveu tem a atualidade de quem deixou-se inebriar pelo bom odor de Cristo (2 Cor 2,15), vivendo uma comunicação não violenta e amorosa. Talvez não faça sentido para muitos pensar no anjo bom da Bahia como inspiração para a comunicação. 

A sua ação pastoral e social sempre despertava interesse da mídia que a auxiliava em sua campanha, mas nunca se preocupou em ser o centro da mensagem. Este era o pobre, que manifestava o rosto de Deus. Manteve a consciência de que foi um instrumento aberto à ação do Espírito, mesmo frágil e com saúde debilitada. “Eu nada fiz, porque nada sou. Quem faz tudo é Deus, nunca se esqueça disso.” 

Irmã Dulce não publicou nada, não fundou veículo de comunicação, falou pouco, mas o suficiente para deixar sua marca. Fez a experiência do que, na Bíblia, é o predicado de Deus e a essência de seu ser: “Deus é amor.” (1 Jo 4,8) As falas de Dulce são o suficiente para testemunhar que amou a Deus e sentiu-se amada por Ele. “Sempre que puder, fale de amor e com amor para alguém. Faz bem aos ouvidos de quem ouve e à alma de quem fala.”

Na sua primeira mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, em 2014, o papa Francisco provoca os comunicadores a como manifestar proximidade no uso dos meios de comunicação e no novo ambiente criado pelas tecnologias digitais. “Encontro resposta na parábola do bom samaritano, que é também uma parábola do comunicador”, diz o Papa.

Túmulo de Santa Dulce dos Pobres na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia
Após sua morte, em 13 de março de 1992, Irmã Dulce foi sepultada na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia. Atualmente, uma lápide marca o lugar de sua sepultura. (Créditos: Marcus Tullius)

A proximidade está na raiz da vocação samaritana do comunicador assim como também está na vocação samaritana de irmã Dulce. Não tenho dúvida de que, nos muitos momentos em que se pôs em oração – no mesmo lugar, na mesma capela –, rezou este Evangelho e se colocou no caminho de Jericó em atitude próxima, acolhedora, terna, misericordiosa, cuidadora.

Certamente, as dificuldades não faltaram neste itinerário. E, mais uma vez, quero afirmar a minha convicção de que em Santa Dulce dos Pobres vejo um exemplo luminoso para a comunicação hoje. Diante das dificuldades, dos desânimos, das ciladas, ela foi resignada. Quando pensar em desistir, reze: “Se fosse preciso, começaria tudo outra vez do mesmo jeito, andando pelo mesmo caminho de dificuldades, pois a fé, que nunca me abandona, me daria forças para ir sempre em frente.”

Dulce, ajudai-nos a amar e a comunicar a experiência que fazemos do amor!

 

Marcus Tullius é coordenador-geral da Pascom Brasil e membro do Grupo de Reflexão sobre Comunicação da CNBB (Grecom CNBB). É mestrando em Comunicação Social pela PUC Minas. Autor do livro Esperançar: a missão do agente da Pastoral da Comunicação e organizador do livro Comunicar para humanizar: a comunicação a partir do Papa Francisco, pela editora Paulus.

 

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